Dizem ser saudosismo exagerado ficar revivendo o passado, traçar paralelos e comparar a maneira como o futebol brasileiro é praticado hoje em relação ao de décadas mais vitoriosas. Mas é gritante a diferença nos dias atuais, especialmente quando se compara ao adotado na Europa. Quem começou, como eu, ainda garoto, a acompanhar a bola rolando em época de legião de craques talentosos que nos proporcionaram, entre 1958 e 2002, cinco Copas do Mundo e outras conquistas memoráveis, sabe muito bem do que estou falando. O futebol, ofensivo ao extremo, era praticado com a elegância e simplicidade em campo de um Rei Pelé, de Ademir da Guia, Djalma Santos, Mauro Ramos de Oliveira, Roberto Dias, Rivellino, Dino Sani, Garrincha, Zico, Carlos Alberto Torres, Sócrates, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Didi…citando alguns que desfilavam em campo! Para se ter uma ideia, Pelé atuou com a camisa do Santos por 18 anos, entre 1956 e 1974, recusando quantias astronômicas de clubes poderosos do planeta. Puro prazer de jogar!
O tempo passou. O rumo das coisas se inverteu a ponto de nossas revelações não permanecerem aqui em seus clubes de origem por inúmeras razões, em especial à empresarial e a financeira, tendo ainda a oportunidade na saída em conhecerem novas culturas, estudarem seus descendentes em boas escolas, aprenderem novos idiomas, levarem uma vida digna. Tem lógica, mas o futebol brasileiro também achou um jeito de estacionar no tempo, sem estrutura e com corrupção explícita em alguns casos. E o principal, sem cabeças pensantes a dirigi-lo, dentro e fora dos gramados. O reflexo são arbitragens tendenciosas e que se deixam influenciar pelo assédio de jogadores, espetáculos pobres em técnica e dinamismo, o comportamento banal de alguns atletas – resultando em jogos com número exorbitante de faltas, desrespeito aos árbitros e aos torcedores, raríssimos fundamentos técnicos como dribles e tabelas, com a conivência de `treinadores´ incapazes, irritantes simulações de contusões quando o resultado os favorece, além da agora interferência e intervenção, às vezes por conveniência, do VAR, motivos da ausência de um público mais inteligente nos estádios, preferindo a compra de pacotes televisivos.
A ausência de comprometimento salta aos olhos, como se tem constatado nas últimas atuações da Seleção Brasileira e na diferença gritante na maneira de atuar nos Mundiais de Clubes. O futebol brasileiro já não é mais respeitado como antes. É necessário mudar o conceito de jogo, a cabeça dos jogadores desde a base – dentro e fora dos gramados -, o sistema administrativo das equipes e, principalmente, a forma de atuar de nossos principais clubes, forçados a isso pelo conceito de treinadores que exercem suas funções única e exclusivamente para se garantirem em seus cargos.
Afinal, nos lembramos com frequência de um feliz pronunciamento de Pep Guardiola, treinador considerado revolucionário em termos da prática futebolística moderna, motivo que o define com a uma característica que raríssimos do seu ramo possuem – a disposição para o risco -, salientando que sua fonte de inspiração foi a Seleção Brasileira de 1982, considerada uma das melhores de todos os tempos, exemplo seguido pelos times que dirige: “Não me conformo e não entendo o porquê do futebol brasileiro, com tudo que proporciona em termos de talentos e maior ganhador de Mundiais, se encolher desta maneira diante de seus adversários nas últimas décadas”.
Leivinha Oliveira