O que vale mais: o vinho ou o enoturismo?

Por Mariana Mendes De Luca | @marianamdeluca

Acordei em um sábado pela manhã e arrisquei enviar uma mensagem pelas redes sociais de uma vinícola da região para saber se ainda teria vaga disponível para conhecê-la naquele dia.

Diante da resposta “Pode vir que eu dou um jeito”, eu fui.

E em meio ao caos da recepção, que pensei ser pelo fato da reserva tardia, uma simples girada no rótulo respondeu todas as minhas perguntas, aquele vinho em taça tinha sido colhido, vinificado e envasado no Sul do País.

Mas isso seria algo normal e positivo, se eu não estivesse provando aquele vinho dentro de uma vinícola no Estado de São Paulo.

Aí me veio a pergunta: Essa vinícola (e algumas outras) está aqui pelo vinho ou pelo enoturismo? Se não estão aproveitando o terroir favorável da região — em específico essa, nunca havia sido feito uma colheita no parreiral tímido que cercava o winebar — por que então estar aqui, nessa localização?

“É pelo vinho!”, disse a atendente. Sabemos, por meio de estudos feitos por outra vinícola, que aqui se produz bons vinhos.

Mas minha amiga, que vinho? O vinho nem de lá era! O storytelling (que é a arte de desenvolver uma história) deles não estava encaixando com as informações do seu rótulo.

Para contextualizar a nossa conversa até esse ponto, é importante retomar que é possível produzir vinhos nos estados de São Paulo e Minas Gerais, por meio do método da dupla poda. Ela funciona da seguinte forma: em países em que o verão é seco, a videira produz frutos nessa estação. Como em nosso país o inverno é seco, é feita uma alteração no ciclo da videira possibilitando que seus frutos apareçam nesse período.

Porém, esse ainda é um processo muito custoso, o que também justifica o valor final dos rótulos nesses estados. Em função desse alto custo de produção, é muito difícil posicionar o vinho para competir em uma faixa de preço compatível com a qualidade de entrega. Tornando, assim, ainda mais desleal a concorrência com os vinhos importados.

Mas a verdade é que o preciosismo acerca do método da dupla poda impede que alguns produtores reconheçam que sua parcela de solo, infelizmente (ou felizmente), seja melhor para o enoturismo do que para a produção de um bom vinho.

É polêmico, mas é sensato pensar que, para participar de um momento bom que o vinho proporciona, não precisa necessariamente tomar vinhos ou entender tudo sobre eles. Eu própria tenho uma amiga que não bebe nada alcoólico, mas que me acompanha em várias vinícolas, com sua boa e velha Coca-Cola gelada. Ela e a grande parte das pessoas que estão lá, pasmem, não estão pelo vinho, estão pelo tempo de qualidade.

Ao mesmo tempo, existe uma linha tênue bem perigosa que divide o enoturismo em dois lados: o lado que conseguiu desenvolver um bom vinho e, junto dele, um bom turismo para apresentá-lo, e o lado dos que surfaram nessa onda sem se preocupar com a qualidade final do produto, pois entenderam que nem todos estão ali pelo vinho, e assim estão buscando apresentá-lo por meio de um turismo mediano.

Para o segundo, se eu pudesse dar um conselho, eu diria: aceite, o enoturismo tem um potencial tão grande quanto a viticultura.

E para você que me acompanhou até aqui, eu sugiro que conheça nossas vinícolas regionais, desfrutem de bons momentos e busquem sempre ‘A Próxima Taça’, Um brinde à nossa região e ao esforço dos que estão buscando melhorar cada vez mais nesse universo do vinho!

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