Avançamos?! Sim, diriam os apaixonados por cães e gatos. Avançamos muito. Hoje, o pet tem tudo o que o homem tem. Creio que o pet está no pedestal das espécies domésticas nos lares mundo afora. Talvez, o que se aproxima um pouco das inúmeras benesses dos pets é o cavalo de raça, mas, este, ainda tem um valor em si que interessa muito ao homem financista, pois o dono pode guardar na lembrança o amor pelo animal se tiver uma boa oferta por ele.
Mas, o que se dirá sobre nossos outros domésticos que nos servem, não no emocional, acalentando nossas fragilidades, inseguranças e desejos, mas sim no prato? Será que conseguimos dar os devidos direitos aos que também merecem?
Na realidade, conceder direitos aos animais depende inteiramente de nossa boa vontade. Por isso os animais desfrutarão apenas dos direitos com os quais possamos lidar. (Frans De Waal 2020).
A proteína animal alimenta o mundo, não só dos humanos, mas de outras dezenas de espécies, como o cão e o gato. Esta (proteína), até tem comitês que defende o bem-estar dos animais, mas parece não vencer a necessidade do mercado, prevalecendo o sistema de confinamento em espaço pequeno e ração engordativa! Mas ainda não conquistou, por exemplo, a bandeira de protegido como o cão, que tem vozes humanas e direitos para os defender.
Como quase tudo hoje em dia, polarizamos. O cão virou um privilegiado de muitas pessoas. O mercado pet se encaixou como uma luva nos anseios do consumismo e a proteína animal também se encaixou muito bem no mercado financeiro ao ponto de infringir, facilmente, algumas regras do bem-estar animal para acelerar o processo de produção e abastecer a indústria de commodities.
Obviamente, que o veganismo também cresceu. Esse é o outro lado da polarização que, conscientemente, questiona hábitos evolutivos das espécies humana e “propõe” um homem, com caninos e vesícula biliar desenvolvidas, a moldar-se um aparelho digestório herbívoro, granívoro e frugívoro, mas não carnívoro.
Sempre na polarização, o pet permanece soberano, perante os demais mamíferos, aves e peixes que ingerimos. Esses, da proteína animal, continuam engaiolados, confinados, transportados para morte breve, enquanto o dono de pet passeia no shopping com coleiras, sapatinhos, carrinho e toda sorte que movimenta cerca de 60 bilhões anuais no Brasil com o mercado pet. Em um fast food “ambos” pedem um belo hambúrguer que vem da indústria de proteína animal que nos coloca no 2º maior mercado do gênero no mundo. Claro que o “Totó” recebe um pedacinho de carne sem a menor disciplina vegana.
A reflexão é sobre o especismo. Por que fazemos isso? Por que não nos importamos com as distorções? No fim das contas, tudo, sempre tudo, é para uma única espécie: o homem. Se der lucro, não tem problema confinar ou enfeitar. Mas, de quem é o lucro? Eu não lucro em transformar meu cão numa criatura humana; eu não lucro se me forçar a comer um bife marmoreado na gordura… No máximo, acelero minha arterosclerose.
O cão também não lucra em abdicar de seus instintos, muito menos o gado, ave ou o porco com a rapidez do seu crescimento e distância da sua prole. Para quem estamos trabalhando às custas das distorções impostas aos animais? Como estabelecemos esses direitos?
Melhor deixar esse assunto na confusão entre o carnívoro estrito, o vegano radical e o mercado. Os animais a gente vê depois; afinal, eles não têm sentimentos e já foram considerados seres inferiores. Viva o homem e o que lhe convém!
Plínio Aiub é médico veterinário especialista em animais silvestres