O mundo vivenciou duas grandes pandemias importantes nos últimos 100 anos, que têm muitas semelhanças e algumas diferenças.
A primeira semelhança é a rápida disseminação e o impacto do grande número de casos e mortes ocorridos, no mundo, com repercussão econômica importante em todos os países.
A Gripe Espanhola, que não se iniciou na Espanha e, segundo alguns, teve origem nos Estados Unidos, foi disseminada na Europa durante a guerra. Na época as epidemias eram denominadas com nome de países onde passou. Por causa do sentimento xenofóbico, a Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a denominar as pandemias com nome do vírus abreviado e o ano de seu início. Daí o nome Covid-19.
O “negacionismo” da pandemia pelas autoridades centrais e consequentemente de parte da população existiu no início da Gripe Espanhola e é grave na epidemia atual. A Imprensa, nas duas ocasiões, foi acusada de sensacionalista e ameaçada por divulgar informações da realidade.
No Brasil, a Gripe Espanhola possibilitou a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública, em 1919, com o objetivo de coordenar as ações nas epidemias, e o Covid-19 tem mostrado a importância de sistemas de saúde universais que garantam o atendimento de todos que dele necessitem.
O Sistema Único de Saúde (SUS), apesar do baixo financiamento, tem sido o garantidor do atendimento, em nosso País, mas ainda mostra iniquidades no atendimento, demonstrada na falta de leitos na região Norte, com mortes de cidadãos sem ou com atendimento precário. Em alguns países sem Sistema de Saúde Universal, como os Estados Unidos, tivemos mortes sem atendimento em Nova York e endividamento das famílias para garantir atendimento em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). O sistema funerário entrou em falência, em vários locais, em ambas as pandemias.
Tanto a gripe espanhola como a atual atinge a população de todas as idades, apesar da Gripe Espanhola ter predominado em adultos jovens, talvez pela guerra. Todos são vulneráveis, pois ninguém tem imunidade, mas os mais pobres são mais atingidos, pelas condições de vida e trabalho, na epidemia atual.
Os boatos sobre a origem das epidemias também têm semelhanças: na Gripe Espanhola disseram que os alemães haviam espalhado a doença por terem perdido a 1º Grande Guerra e agora dizem que os chineses criaram o vírus em laboratório, apesar dos estudos científicos dizerem o contrário. Hoje as ‘fake news’ espalhadas pela internet causam um grande desserviço ao País, pois desinformam e confundem a população quanto à importância do isolamento social e na divulgação de tratamentos não comprovados cientificamente.
A diferença nas pandemias é mais bem observada no avanço científico atual com a descoberta do vírus que a ocasionou, seu isolamento, sua genotipagem em tempo recorde e a possibilidade de vacina no próximo ano. Além disso, a velocidade de disseminação do vírus no mundo é consequência do transporte rápido e intenso entre nações.
Na Gripe Espanhola, os médicos não acreditavam na importância da quarentena e no isolamento social e atualmente são os primeiros a pedirem que a população fique em casa.
Finalizando, enquanto a Gripe Espanhola possibilitou a criação de uma Coordenação Nacional, na atual, apesar do Ministério da Saúde, não temos uma Coordenação Nacional que garanta o bom êxito no controle do Covid-19.
Marta Salomão é médica Sanitarista