Natural de Águas da Prata, juiz é acusado de usar identidade falsa

Por Pedro Souza
[email protected]

Um caso inusitado e de grande repercussão nacional envolve um personagem com raízes bem próximas: o juiz aposentado José Eduardo Franco dos Reis, natural de Águas da Prata, foi denunciado pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) por utilizar, ao longo de 45 anos, uma identidade falsa com nome de suposta nobreza britânica: Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield.

Fraude: juiz foi denunciado por utilizar identidade falsa com nome de suposta nobreza britânica (Reprodução)

Segundo a denúncia do MPSP, José Eduardo usou documentos ideologicamente falsos desde a década de 1980. Com o nome fictício, ingressou na tradicional faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), onde se formou em 1992, foi aprovado no concurso para juiz em 1995 e atuou até sua aposentadoria em abril de 2018, na 35ª Vara Cível Central da Comarca de São Paulo.

A descoberta da fraude só veio à tona recentemente, quando ele tentou renovar o RG, em outubro de 2024, em um posto de atendimento no centro da capital paulista. O sistema biométrico detectou que as digitais associadas ao nome Edward Wickfield coincidiam com as de José Eduardo. A Polícia Civil abriu investigação e confirmou que os dois nomes pertenciam à mesma pessoa.

Mesmo após a aposentadoria, o juiz continuou a receber altos vencimentos. Em fevereiro deste ano, o Portal da Transparência do Tribunal de Justiça de São Paulo registrou o pagamento de R$ 166.413,94 em remuneração bruta, valor que inclui gratificações e outras vantagens acumuladas por José Eduardo.

De acordo com o Ministério Público, o juiz enganou diversas instituições públicas por mais de quatro décadas. Em uma entrevista concedida à Folha de S.Paulo em 1995, se identificava como descendente de nobres britânicos e afirmava ter vivido até os 25 anos na Inglaterra. Os registros, no entanto, mostram que nasceu em 17 de março de 1958, no cartório da instância hidromineral de Águas da Prata, filho de José e Vitalina, nomes bem brasileiros.

Na mídia: em 1995, Folha de S.Paulo fez matéria com o juiz (Acervo/Folha)

CONSTRUÇÃO DO PERSONAGEM

A falsa identidade teria sido criada em 19 de setembro de 1980, quando ele conseguiu emitir um RG em nome do personagem inglês. No documento constavam os nomes dos supostos pais fictícios: Richard Lancelot Canterbury Caterham Wickfield e Anna Marie Dubois Vincent Wickfield.

Com essa identidade, o juiz ocupou cargos de destaque no Judiciário paulista, inclusive como coordenador do Núcleo Regional da Escola Paulista da Magistratura em Serra Negra (SP). Ao longo da carreira, assinou milhares de decisões judiciais com o nome fictício.

REPERCUSSÃO

A denúncia foi apresentada à 29ª Vara Criminal de São Paulo em 27 de fevereiro deste ano. A Justiça aceitou a denúncia na segunda-feira (31), tornando o juiz aposentado réu pelos crimes de falsidade ideológica e uso de documentos falsos.

O caso ganhou repercussão nacional pela inusitada construção de uma identidade inspirada em personagens britânicos e por envolver um magistrado que exerceu funções de alto nível no sistema judiciário.

DESFECHO

Ao final da denúncia, o Ministério Público pediu aos órgãos competentes que cancelem os documentos de José Eduardo com o nome falso, incluindo o CPF em nome de Wickfield. A Promotoria também pediu medidas cautelares alternativas à prisão, como a entrega do passaporte do denunciado e a proibição de ele se ausentar da cidade onde mora.

COMPARTILHAR

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here